Narrador
Eles haviam chegado a Ilha, mas parecia que algo havia mudado. A casa estava linda, toda arrumada e acolhedora. Porém, Micael e Sophia permaneciam calados, distantes um do outro, com uma linha tênue de perguntas sem respostas…Micael não conseguia entender o porque ela sempre era gentil com quem não tinha precisão, deixar que outro homem passasse a mão na barriga que abrigava seus filhos era demais, e ele não a perdoaria tão fácil. Por outro lado tínhamos Sophia, toda preocupada com o que tinha acontecido, na cabeça dela não tinha acontecido nada demais, aliás, ela nem se lembrara de ter deixado o comissário tocar em sua barriga, ele começou a contar a história de sua vida e quando se deu conta já era tarde demais. Bom início de casamento, pensava ela.
Os dois entraram no quarto para levar as malas, e ficaram pasmos com o que viram. O quarto estava belo, a cama forrada por cetins, e pétalas espalhadas no mesmo. A vista, como sempre, era graciosa, mostrava a maresia e trazia um frescor único. A viagem tinha demorado muito, eles se atrasaram mais do que o previsto, por isso já era possível notar a noite cair, o clima não poderia ser mais perfeito. Mas como dissera antes, Micael e Sophia eram dois estranhos, olharam para cama e depois se entreolharam sem graça:
-O quarto é lindo – Sophia disse sorrindo
-Concordo – foi apenas o que ele disse, antes de começar a tirar a roupa.
-A gente poderia tomar banho, e depois posso preparar algo pra comer, a dispensa ta cheia de coisas deliciosas, o que acha?
-Pode cozinhar só pra você, não estou com fome.
-Mas você não comeu quase nada, tem certeza ?
-Tenho sim – ele tirou a camisa e os olhos de Sophia acompanhou aquele abdômen perfeito, se arrependera das brigas naquele momento.
-A gente pode tomar banho na banheira do quarto, ela parece ser maravilhosa.
-Eu prefiro o chuveiro mesmo…se quiser, pode ficar com a banheira.
-Não tem graça sozinha – ela se aproximou de Micael lentamente.
-Bom, eu já vou tomar banho – respondeu rápido e saiu para o banho.
Sophia estava atônita, ele nunca negara um banho com ela, em todo esse tempo, nunca havia dito “não”. Ela sabia que aquela não tinha sido uma briguinha, o que acontecera tinha mexido com Micael de verdade, e agora se preocupava com o que aconteceria.
Depois do banho Sophia foi fazer um macarrão, seus filhos já clamavam por uma refeição de verdade. Enquanto ela cozinhava, Micael olhava a vista da janela da sala, então foi à vez dela insistir mais um pouco:
-Tem certeza que não vai querer, ta uma delícia – dizia pegando o prato e colocando uma quantidade assustadora de macarrão.
-Você deveria comer algo mais saudável não acha? – ele disse se aproximando
-Macarrão é muito saudável, e seus filhos adoram – disse rindo
-Você sempre coloca a culpa neles, mas sabe que precisa se alimentar direito.
-Filhos, falem para o seu pai, o quanto adoram meu macarrão – Sophia disse fazendo gracinha, e ergueu a blusa, o que deixou sua pequena barriga à amostra – Pode conferir se eles não estão pulando aqui dentro.
-Melhor não…eu sei que eles são seus cúmplices –disse rindo
-Tudo bem – ela respondeu baixo, e começou a comer.
Sophia Narrando
Micael já estava me deixando louca, eu jurava que ele mudaria de humor logo que chegássemos, mas não, ele continuava frio, calado, e fingindo que eu não existia. Eu não fazia ideia de como fazer para esse clima passar, eu só queria que passasse o mais rápido possível, pois não estava aguentando a distância que se estendia entre nós. Ele estava no quarto e eu na sala, mas estava impaciente, não conseguia me concentrar em nada, pois sabia que ele deveria estar triste, e não gostava de vê-lo daquela maneira. Então fui para o quarto. Chegando lá, vi-o deitado olhando alguns papéis, concentrado. Aproximei-me da mala e tirei um lingerie, vi que ele me observava de canto, mas não o deixei perceber. Troquei-me ali mesmo, e precisei me conter para não rir da respiração ofegante de Micael, era engraçado, pois o mesmo tentava não demonstrar, mas eu sabia o quanto ele devia estar doidinho para vir até mim. Quando terminei, fui para cama e me juntei a ele.
-Está trabalhando? – perguntei
-Não, estou apenas resolvendo algumas coisas… – continuou a ler
-E que coisas seriam essas?
-Anda muito curiosa, não acha?
-Somos casados, não podemos ter segredos…- me aproximei dele, e mesmo tendo tanta relutância, coloquei a cabeça em seu ombro
-É um testamento – respondeu
-Um testamento? – perguntei preocupada – Pra que um testamento Micael?
-Comprei algumas ações, estou fazendo alguns investimentos, e assim que voltar para o Brasil vou fechar um negócio grande com uma multinacional…
-E o que isso tem haver com testamento?
-Nunca se sabe o dia de amanhã…
-Você ta falando de morte Micael?
-Eu sei que pra você parece estranho, mas é apenas precaução.
-Você esta pensando em morte na nossa Lua de Mel? – disse segurando as lágrimas – Era pra gente aproveitar hoje sabia? É o nosso momento por tudo que já passamos, e você fica aí, lendo um maldito testamento…
-Calma, não chore por favor – ele dizia me acalmando – Eu só estou mexendo com isso porque o advogado pediu urgência, não estou planejando morrer tudo bem?
-Então prometa Micael, prometa que você nunca vai morrer, nunca vai nos deixar, promete?
-São coisas que a gente não pode prometer…
-Promete agora – disse firme
-Faz o seguinte, eu prometo que enquanto eu viver, não deixarei de te amar, okay?
-Você não pode me deixar nunca ouviu? – disse e o abracei. Micael foi pego de surpresa no abraço, demorou pra corresponder. Ele ainda estava ferido, mas naquele momento eu só queria conforto, e ele entendia isso.
-Eu não quis te deixar mal, se soubesse nem tinha falado – disse me colocando em seu colo- Eu só achei que agora que temos filhos, deveria cuidar para que se algo…
-Não vai acontecer nada, e eu nem vou precisar desse testamento idiota. Por mim, rasgaria ele agora mesmo.
-Não vai fazer isso – ele puxou o pequeno papel das minhas mãos – É apenas um pedaço de papel…
-Um pedaço de papel que nunca vou usar, porque nossos filhos vão nascer, seremos uma família completa, e nunca vamos nos afastar, jura de mindinho ?
-Eu juro, eu juro – ele respondeu baixo e juntamos nossos dedos. Logo depois disso, fiquei abraçada nele mais um pouco, estava tão bom aquele momento que tinha medo de estragar alguma coisa. Nem deu tempo de cogitar essa possibilidade, Micael já estava me afastando de novo – Precisa dormir…esta ficando tarde.
-Não estou com sono – disse saindo de seu colo.
-Eu estou bem cansado – ele dizia afastando os papéis e pegando o lençol.
-A gente poderia assistir um filme, ou dar um mergulho, o que acha?
-Não esta muito tarde pra pensar em praia?
-Só tem a gente nessa Ilha, e o tempo está ótimo.
-Você esqueceu que esta gravida?
-E o que isso tem haver?
-Os bebês precisam descansar…
-Eles descansaram naquele voo interminável que tivemos do Brasil até aqui, ou já esqueceu?
-Não tem como esquecer – ele disse sério, e se virou. Percebi que meu comentário não teve um efeito positivo e tentei mudar de assunto.
-Vamos, por favor – pedia puxando o lençol de seu corpo.
-Eu não estou com clima pra isso Sophia, hoje quero descansar, de verdade.
-Nem se for sexo? – perguntei sorrindo e subi em cima dele, logo comecei a beijar seu pescoço e morder sua orelha.
-Sophia, por favor, pare…
-Eu coloquei sua camisola preferida…
-Sophia, por favor…
-Sophia? Me chamou pelo nome? – me afastei dele rapidamente e desci da cama – Eu deveria ter anulado mesmo.
-O que disse?
-Deveria ter anulado como fui aconselhada…
-Quer anular o casamento é isso?
-Quero – disse sem perceber – Porque eu prefiro a gente como era antes…
-Então anula Sophia, vai em frente…
-Agora me diz, o que eu fiz pra você? fala Micael – dizia gritando
-Eu não quero discutir com você, esquece isso…
-É a nossa Lua de Mel, era pra gente estar feliz, mas você estragou tudo…
-Estraguei? – ele se levantou da cama – Não me lembro disso. Só consigo me lembrar da minha mulher falando com um cara no avião, ou melhor, deixando que outro homem tocar em sua barriga. Achas certo?
-Eu não tive culpa Micael, só quis..
-Ser gentil, eu já sei – ele respondeu sério – Quem deu a ideia de anular o casamento?
-Ninguém…
-Fala Sophia – pediu sério
-O comissário….
-E agora vai me dizer que eu estava errado quanto à ele?
-Micael por favor…
-Eu sempre ouço que to exagerando, que estou passando dos limites, mas sempre acabo acertando. Estávamos felizes ontem, e agora você quer anular o casamento… tem noção do que aconteceu com a gente por causa dele?
-E eu estou tentando me redimir a tempos com você, e o que tem feito? Me evitado desde que chegamos. Você nem dá espaço para que eu me explique e…
-Sabe de uma coisa – ele respirou firme – estou cansado dessa conversa
Micael disse aquilo e saiu, e eu fiquei ali, sozinha, em lágrimas. Eu estava errada, muito errada. Ele havia me avisado sobre aquele cara, e eu fiz vista grossa. Precisava entender que agora estava casada, tinha que me colocar na postura; Eu nunca deveria ter falado na anulação, foi uma coisa na hora da raiva, um erro enorme, precisava reverter isso.
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